Francisco de Xavier sentiu-se abalado pela conquista do Reino de Navarra por Castela. Então o rei de Portugal D. João III pediu ao Papa Paulo III para que este lhe enviasse missionários para os territórios da Índia. D. João III é aconselhado pelo diretor do Colégio de Santa Bárbara, Diogo de Gouveia, a chamar para os Reino de Portugal jovens da Companhia de Jesus. Inácio de Loyola escolhe Simão Rodrigues e Nicolau Bobadilla para essa missão, mas este adoece e Francisco é nomeado seu substituto, chegando a Portugal em 1540. Parte no ano seguinte, a 7 de abril, a bordo da nau S. Diogo, a nau capitânia das cinco naus da frota comandada por Martim Afonso de Sousa, que ia que tomar posse do cargo de governador na Índia.
Em agosto ancoraram na ilha de Moçambique e depois em Melinde. Durante a viagem, muito atribulada pela difusão do escorbuto na tripulação, as qualidades e o carisma de Francisco Xavier foram evidentes. A nau Santiago chegou a Goa a 6 de maio de 1542. O trabalho de Francisco de Xavier inauguraria mudanças na Indonésia, tendo-se tornado conhecido como o “Apóstolo das Índias” quando, entre 1546 e 1547, trabalhou nas Molucas. Depois de partir da região já havia entre 50 e 60 mil católicos. Em dezembro de 1547, em Malaca, Francisco de Xavier conhece Fernão Mendes Pinto, que regressava do Japão e trazia consigo um nobre japonês de nome Angiró que ouvira falar de Francisco em 1545 e viajara de Cagoxima para Malaca com o propósito de o conhecer. Angiró, acusado de um crime, fugira do Japão. Abriu o seu coração a Francisco, confessando-lhe a vida que levara até ali, mas também os costumes e cultura da sua terra natal. Angiró foi batizado por Francisco Xavier e adotou o nome português de Paulo de Santa Fé. Como antigo samurai, tornar-se-ia um valiosíssimo mediador e tradutor na missão ao Japão. Francisco teve um forte impacto no Japão, tendo sido o primeiro jesuíta nesse encargo. Os japoneses não se revelaram ouvintes fáceis. Muitos eram budistas e Francisco Xavier teve dificuldade em explicar-lhes o conceito de Deus criador de tudo o que existe e o mesmo relativamente ao inferno. Apesar das diferenças religiosas, Francisco Xavier terá sentido que os japoneses eram um povo bom, como os povos europeus, e que por isso poderiam ser convertidos. Morreu em Sanchoão (1552) às portas da China. Homem santo de três religiões – cristã, hindu e muçulmana – o seu corpo é venerado na Basílica do Bom Jesus de Goa, constituindo caso único na história das religiões.
A “Peregrinação” de Fernão Mendes Pinto (c. 1510-1583) põe-nos diante uma verdadeira personagem romanesca, que assume diferentes acontecimentos e personalidades, e que descreve de um modo notabilíssimo, o que era a vida de um português no Oriente – criado de fidalgo, soldado, escravo, agente de negócios, pirata dos mares da China, mercador, médico ocasional do rei do Bongo, vagabundo e embaixador -, a verdade é que isso simboliza o português do mundo. Os estudiosos sobre esse tempo são os primeiros a considerar que não é possível compreender o que João de Barros ou Diogo do Couto nos relataram sem ler Fernão Mendes Pinto. Este é a personagem completa, que não precisa de convencer ninguém que deixa de ser quem sempre foi. O próprio título com que a obra foi publicada dá-nos a expressão plena da riqueza do relato. “Peregrinaçam de Fernam Mendez Pinto em que da conta de muytas e muyto estranhas cousas que vio & ouvio no reyno da China, no da Tartaria, no de Sornau, que vulgarmente se chama de Sião, no de Calaminhan, no do Pegù, no de Martauão, & em outros muytos reynos & senhorios das partes Orientais, de que nestas nossas do Occidente ha muyto pouca ou nenhua noticia. E também da conta de muytos casos particulares que acontecerão assi a elle como a outras muytas pessoas. E no fim della trata brevemente de alguas cousas, & da morte do Santo Padre Francisco Xavier, unica luz & resplandor daquellas partes do Oriente, & reitor nellas universal da Companhia de Iesus”. Ao ler a obra, houve entre os contemporâneos quem duvidasse dos relatos, respeitantes aos vinte e um anos em que andou pela Ásia, tendo sido, na sua própria expressão, “treze vezes cativo e dezassete vendido nas partes da Índia, Etiópia, Arábia Feliz, China, Tartária, Macáçar, Samatra e muitas outras províncias daquele Ocidental arquipélago dos confins da Ásia”. A escrita começou logo em 1557, com a memória bem fresca, só sendo publicada trinta e um anos depois da sua morte (1614), por Pedro Craesbeek, com tardia autorização do Santo Ofício. Aos que duvidaram da veracidade dos relatos, o autor respondeu significativamente: “a gente que viu pouco mundo, como viu pouco também costuma dar pouco crédito ao muito que os outros viram”.
É memorável o encontro de Fernão Mendes Pinto com António de Faria, o célebre corsário, numa situação, em que quiseram saber novidades de Liampó, “porque se soava então pela terra que era lá ida uma armada de quatrocentos juncos em que iam cem mil homens por mandado de El-Rei da China a prender os nossos que lá iam de assento, a queimar-lhes as naus e as povoações, porque os não queria em sua terra, por ser informado novamente que não eram eles gente tão fiel e pacífica como antes lhes tinham dito”, mas afinal era engano, pois essa armada tinha ido, afinal, socorrer um Sultão nas ilhas de Goto. É inesquecível a perseguição ao corsário mouro Coja Acém, que se dizia “derramador e bebedor do sangue português” e a quem Faria jurara vingança, por lhe ter roubado as fazendas e morto os companheiros na batalha mais violenta da “Peregrinação”. “E arremetendo com este fervor e zelo da fé ao Coja Acém como quem lhe tinha boa vontade, lhe deu, com uma espada que trazia, de ambas as mãos, uma tão grande cutilada pela cabeça que, cortando-lhe um barrete de malha que trazia, o derrubou logo no chão…”. E lembre-se o episódio da vinda do Embaixador do Rei dos Batas. Pero de Faria fê-lo «agasalhar o mais honradamente que então foi possível». E assim «o despediu bem despachado, e satisfeito do que viera buscar, porque lhe deu ainda algumas cousas além das que lhas pedira, como foram cem panelas de pólvora, e rocas, e bombas de fogo, com que se partiu tão contente desta fortaleza, que chorando de prazer, um dia perante todos os que estavam no tabuleiro da igreja, virando-se para a porta principal dela, com as mãos levantadas, como quem falava com Deus, disse publicamente. Prometo em nome de meu Rei a ti Senhor poderoso, que com descanso e grande alegria vives assentado no tesouro das tuas riquezas que são os espíritos formados da tua vontade, que se te praz dar-nos vitória contra este tirano de Achem (…). E assim te prometo e juro com toda a firmeza de bom e leal, que meu Rei não tenha nunca outro Rei se não este grande português, que agora é senhor de Malaca». Fernão Mendes construiu, deste modo, no dizer de António José Saraiva, «um Oriente espantosamente humano, que tem o seu estilo próprio. Um Oriente que não é feito só de cidades, templos e esculturas, mas também do estilo falado, de etiquetas humanas, de sentimentos típicos». E assim a nossa cultura é inesgotavelmente peregrina!