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(V) O Gótico Português

Ao lembrarmos o célebre texto de Alexandre Herculano sobre a Abóbada, recordamos Afonso Domingues, um dos grandes criadores do gótico português, mestre na construção do Mosteiro de Santa Maria da Vitória, que assinala a Batalha de Aljubarrota, a homenagem a D. João I, a D. Filipa de Lencastre e à Ínclita Geração e a legitimação do Mestre de Avis como Rei de Portugal. E fica-nos no ouvido a passagem emblemática de Herculano: “O arquiteto, gasto de velhice, não pôde resistir ao jejum absoluto a que se condenara. No momento em que, ajudado por Martim Vasques e Ana Margarida, se quis erguer, pendeu moribundo nos braços deles e aquele génio de luz mergulhou-se nas trevas do passado”. Contudo ficara demonstrado o seu saber e o antigo talento, que garantiram a perenidade da sua obra, como o tempo demonstrou! O Mosteiro de Santa Maria da Vitória ou da Batalha é a referência central do gótico português, o seu auge. A obra, começada em 1388, seguindo até o século XVI, introduziu o gótico flamejante em Portugal, distanciando-se, apesar da moderação, da estética mais austera dita mendicante. Esta orientação influenciaria diversas obras em Portugal no século XV, como a Igreja da Graça de Santarém, a capela do Castelo de Leiria, a Sé da Guarda e o Convento de Nossa Senhora da Conceição em Beja.

O gótico português surge no último quartel do século XII, com o Mosteiro de Alcobaça, começado em 1178 e habitado a partir de 1222. Fundado pelo primeiro rei de Portugal para a Ordem de Cister é a primeira edificação inteiramente gótica de Portugal. O Claustro da Sé Velha de Coimbra também corresponde a esta primeira fase. Contudo, a evolução do estilo românico para o gótico ocorreu lentamente, havendo muitas igrejas portuguesas de estilo de transição românico-gótico nos séculos XIII e XIV. O desenvolvimento da arquitetura gótica em Portugal deveu-se muito às ordens religiosas (beneditinos, franciscanos, dominicanos, agostinhos e carmelitas) com vários mosteiros em cidades portuguesas.

Impõe-se que não esqueçamos o que Garrett disse da capital do gótico. “Santarém é um livro de pedra em que a mais interessante das nossas crónicas está escrita.” Que melhor poderemos dizer de algo que nos caracteriza tão bem? São exemplos do gótico mendicante diversos templos de Santarém – como as igrejas de S. Francisco, Santa Clara e Santa Maria de Almoster – e de Guimarães (Capela de S. Francisco), bem como o Mosteiro de Santa Clara a Velha de Coimbra, o Mosteiro de S. Francisco no Porto ou o Convento do Carmo em Lisboa. Igualmente as ordens militares contribuíram para a expansão do gótico, como no caso de S. João de Alporão, em Santarém, o Mosteiro de Leça do Bailio (Hospitalários) e Santa Maria dos Olivais em Tomar, fundada pelos Templários. Algumas catedrais portuguesas também foram construídas em estilo gótico, como a Sé de Évora, (séc. XIII, XIV), a Sé de Silves (séc. XIV-XV) e a Sé da Guarda (séc. XV-XVI).

Na estatuária o gótico português reserva-nos algumas obras-primas como os túmulos de D. Pedro e D. Inês de Castro em Alcobaça, exemplos de uma referência mítica que a cultura europeia assumiu e desenvolveu, bem como da Ínclita Geração na Batalha, além das esculturas jacentes nas Sés de Braga e Évora. Já na pintura os Painéis ditos de S. Vicente, de Nuno Gonçalves, representam referências fundamentais da arte europeia do seu tempo, que demonstram também nesse domínio a identidade inesquecível do gótico português, com um equilíbrio excecional entre a força anímica e a moderação naturalista dos seus elementos.

GOM

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