Uma Peça do MNAA por Semana
O CNC e o Museu Nacional de Arte Antiga levam a efeito desde 2006 uma iniciativa comum de divulgação das peças mais significativas do primeiro Museu português. Deste modo, queremos promover o melhor conhecimento do nosso património cultural, incentivando a visita aos nossos Museus, e em especial ao Museu Nacional de Arte Antiga.
Além da divulgação no portal www.e-cultura.pt e no sítio www.cnc.pt, promoveremos ao longo do ano outras iniciativas que serão divulgadas nos nossos programas trimestrais. A memória cultural constitui um factor fundamental para a melhor compreensão da nossa identidade, vista como realidade aberta, na encruzilhada entre a herança e a criação, entre a tradição e a inovação.
Agradecemos à Direcção do MNAA e à sua equipa a oportunidade que nos dá de melhor conhecermos um acervo tão rico e fundamental para a compreensão do que somos como povo e como cultura.
Uma Peça do Museu Nacional de Arte Antiga
Semana de 5 a 12 de Janeiro de 2010
Custódia de Belém
Portugal, 1506
Atribuída a Gil Vicente
Ouro e esmaltes polícromos
Inscrição: 0. MVITO. ALTO. PRI(N)CIPE. E. PODEROSO. SE(N)HOR. REI. DÕ. MANVEL.I. A . MANDOV.
FAZER. DO OVRO. I .DAS.PARIAS. DE. QVILOA. AQVABOV. E.CCCCCVI
Prov. Mosteiro de Santa Maria de Belém (Jerónimos)
Inv. 740 OUR
A mais famosa obra da ourivesaria portuguesa, quer pelo seu mérito artístico, quer pelo seu significado, foi mandada lavrar pelo rei D. Manuel I para o Mosteiro de Santa Maria de Belém dos frades Jerónimos.
A palavra custódia significa em latim guarda, e em linguagem sacra designa o vaso usado para guardar e expor à veneração dos fiéis o Filho de Deus, eucaristicamente presente na Hóstia Consagrada, em torno da qual, nesta peça prodigiosa, se ajoelham os doze apóstolos perfeitamente individualizados. Sobre eles paira uma pomba oscilante em ouro esmaltado a branco, símbolo do Espírito Santo, e, no plano superior, a figura de Deus Pai sustentando o globo do Universo, materializando-se deste modo, no sentido ascencional, a representação das três pessoas da Santíssima Trindade, o Novo e o Antigo Testamento.
Esta micro-arquitectura do gótico final, atribuível ao ourives/ dramaturgo Gil Vicente, é uma obra inultrapassável de virtuosismo técnico executada com o ouro das páreas – tributo do Régulo de Quilôa, em sinal de vassalagem à coroa de Portugal, trazido por Vasco da Gama no regresso da sua segunda viagem à Índia em 1503.
Três anos levou Gil Vicente a lavrar e esmaltar os trinta marcos de ouro, que “AQVAB(O)V. E(M).CCCCCVI” (1506), como se lê na legenda que corre em torno da base.
Não precisaria o ourives de escrever a sua legenda histórica na base desta custódia. As esferas armilares, divisa de D. Manuel I, que definem o nó, como que a unir dois mundos (o terreno, que se espraia na base, e o sobrenatural, que se eleva na estrutura superior) surgem como a consagração máxima do poder régio nesse momento histórico da expansão oceânica, confirmando o espírito da empresa do Rei Venturoso e o propósito documental que o grande mestre teve em vista.