A Vida dos Livros

UM LIVRO POR SEMANA

Monique Canto-Sperber é autora de “L’Inquietude Morale et la Vie Humaine” (Presses Universitaires de France, 2002), obra onde chama a atenção, com argumentos de hoje, para a necessidade da valorização da filosofia moral. É preciso regressarmos à tarefa mais antiga da filosofia: pensar a vida humana. A singularidade, a contingência dos acontecimentos, a certeza da morte, a presença do passado e a irreversibilidade do tempo obrigam ao exame filosófico da condição humana.

UM LIVRO POR SEMANA
De 3 a 9 de Julho de 2006


Monique Canto-Sperber é autora de “L’Inquietude Morale et la Vie Humaine” (Presses Universitaires de France, 2002), obra onde chama a atenção, com argumentos de hoje, para a necessidade da valorização da filosofia moral. É preciso regressarmos à tarefa mais antiga da filosofia: pensar a vida humana. A singularidade, a contingência dos acontecimentos, a certeza da morte, a presença do passado e a irreversibilidade do tempo obrigam ao exame filosófico da condição humana. Trata-se de desenvolver um pensamento ético que compreenda e avalie as nossas acções. Como apreciar as diferenças e os conflitos? Como formular critérios e normas de acção? Tolstoi, no fim de “Guerra e Paz”, fala-nos da mudança mental sentida pelo conde Pedro Bezoukov. Mais do que uma conversão, do que a adesão a uma verdade ou do que a evidência de um facto, Pedro adquire “essa tranquilidade de espírito, essa harmonia interior, que tanto o tinha impressionado na atitude dos soldados na batalha de Borodino”. Pascal punha-nos, aliás, de sobreaviso quanto a considerar tudo literalmente ou tudo espiritualmente. Não, a reflexão sobre a vida e o seu sentido obriga-nos a considerar e a compreender as diferentes perspectivas. “Tentar responder à questão do sentido da vida pela elaboração de justificações é uma maneira de regressar ao sentimento de absurdo – ponto de partida para a reflexão. Nisso, é totalmente oposto ao sentido do paradoxo de Kierkegaard, que se abole numa justificação imediata”. Camus falaria do absurdo como “razão lúcida que verifica os seus limites”… E assim a reflexão sobre a existência humana é pautada por condições que explicam a particularidade das justificações existenciais. Estamos diante de uma tensão entre os elementos permanentes da vida humana e os bens e valores que inspiram as nossas razões de agir. E assim podemos entender a injunção socrática, muito citada, mas pouco compreendida: “uma vida sem exame não é um vida verdadeiramente vivida”. A autora considera, deste modo, que as respostas a perguntas do tipo “como devo viver?”, “que pessoa devo ser?” só são possíveis a partir de um exame da minha vida. Mas o bem na vida humana não se reduz nem ao bem subjectivo, nem à objectividade do bem nem ao desenvolvimento humano. É preciso que a pesquisa das justificações existenciais vise uma ordem e uma unidade. No entanto não se trata nem de reduzir o bem a uma noção substancial de virtude nem de nos contentarmos com a ideia de bem como mero resultado de uma escolha racional. O bem não é uma realidade substancial definida de uma vez por todas nem um lugar indeterminado, representa, sim, um princípio formal que pressupõe uma forte aspiração à racionalidade e à objectividade em matéria de valores. A reflexão não acalma as paixões nem torna, só por si, a vida melhor, mas contribui para desenvolver a capacidade para as pessoas agirem autonomamente, de acordo com a racionalidade.   


Guilherme d’Oliveira Martins

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