Com o falecimento de Jorge Sampaio deixa-nos um velho amigo e dos mais antigos sócios do Centro Nacional de Cultura, hoje Sócio honorário, que desde muito jovem militou ativamente nas causas da cultura, da liberdade e dos direitos humanos com uma determinação e coerência que merecem a nossa maior admiração. Desde o momento em que teve um papel fundamental na crise estudantil de 1961 até ao presente nunca deixou de estar presente num combate permanente pelas causas do humanismo universalista. Daí o seu empenhamento no Centro Nacional de Cultura e na fundação da revista “O Tempo e o Modo”, com António Alçada Baptista, João Bénard da Costa e Pedro Tamen. O seu percurso faz parte integrante da história do Centro Nacional de Cultura. Como Presidente da República e depois de ter exercido funções empenhou-se ativamente, sem desfalecimentos, na defesa dos direitos humanos e da cultura da paz, designadamente no apoio aos estudantes sírios e á causa dos refugiados. Antes, não esquecemos o papel crucial desempenhado no Conselho da Europa, na salvaguarda concreta da Convenção Europeia dos Diretos Humanos. Desde a infância, fez estudos musicais e, em virtude da carreira do pai, passou largo tempo nos EUA e na Inglaterra, experiência que o marcou muito. Frequentou os estudos secundários nos liceus Pedro Nunes e Passos Manuel. Em 1961, licenciou-se em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Na Universidade, desenvolveu uma relevante atividade académica, iniciando, assim, uma ação política de oposição à Ditadura. Foi eleito Presidente da Associação Académica da Faculdade de Direito, em 1960-61, e Secretário-Geral da RIA (Reunião Inter-Associações), em 1961-62. Nessa qualidade, foi um dos protagonistas da crise académica do princípio dos anos 60, a qual esteve na origem de um longo e generalizado movimento de contestação estudantil, que abalou profundamente o Regime. Deu, entretanto, início a uma intensa carreira de advogado, que se estendeu por todos os ramos de Direito, tendo desempenhado funções diretivas na Ordem dos Advogados. Teve um papel de relevo na defesa de presos políticos, no Tribunal Plenário de Lisboa. Candidatou-se, em 1969, às eleições para a Assembleia Nacional, nas listas da CDE. Desenvolve uma constante atividade política e intelectual, participando nos movimentos de resistência e na afirmação de uma alternativa democrática de matriz socialista, aberta aos novos horizontes do pensamento político europeu. Após a Revolução do 25 de Abril de 1974, foi um dos impulsionadores da criação do Movimento de Esquerda Socialista (MES), do qual se desvinculou.
Desempenhou, nos anos da Revolução, um importante papel no diálogo com a ala moderada do MFA, sendo um ativo apoiante do “Grupo dos Nove”. Em março de 1975, é nomeado Secretário de Estado da Cooperação Externa, no IV Governo Provisório. Ainda em 1975, funda a “Intervenção Socialista”. Em 1978, adere ao partido Socialista. Em 1979, é eleito deputado à Assembleia da República. De 1979 a 1984, é membro da Comissão Europeia dos Direitos do Homem no Conselho da Europa, realizando aí um importante trabalho na defesa dos Direitos Fundamentais e contribuindo para uma aplicação mais dinâmica dos princípios contidos na Convenção Europeia dos Direitos do Homem. No ano de 1989, é eleito Secretário-Geral do Partido Socialista, cargo que exerce até 1991, e é designado, pela Assembleia da República, como membro do Conselho de Estado. Em 1989, concorre à presidência da Câmara Municipal de Lisboa, cargo para o qual é, então, eleito e depois reeleito, em 1993. Esta candidatura assumiu, na altura, um grande significado político e contribuiu para dar às eleições autárquicas um relevo nacional. Como Presidente da Câmara de Lisboa e à frente de uma equipa, afirmou uma visão estratégica, com recurso a novas conceções e métodos de planeamento, gestão, integração e desenvolvimento urbanístico. Em 1995, Jorge Sampaio apresenta a sua candidatura às eleições presidenciais. Em 14 de Janeiro de 1996, é eleito, à primeira volta. Foi investido no cargo de Presidente da República, no dia 9 de março de 1996, prestando juramento solene. Cumpriu o seu primeiro mandato exercendo uma magistratura de iniciativa na linha do seu compromisso eleitoral. Apresentou-se de novo e voltou a ser eleito à primeira volta, em 14 de janeiro de 2001, para um novo mandato.
O Centro Nacional de Cultura exprime a grande admiração pela memória de quem nos acompanhou desde estudante, sempre com o mesmo entusiasmo e empenhamento. Apresentamos à sua família e amigos as nossas condolências.
Relembramos aqui o podcast Jorge Sampaio – “O Tempo e o Modo: ao encontro da Liberdade”, 2003