Para começar apresento a ilustração de Luís Diferr sobre Lisboa antes do Terramoto…
E faço eco de uma persistente pergunta – por que razão são os lisboetas designados, desde tempos imemoriais, por alfacinhas?
Almeida Garrett imortalizou o epíteto nas «Viagens na Minha Terra», mas não explicou: «Pois ficareis alfacinhas para sempre, cuidando que todas as praças deste mundo são como a do Terreiro do Paço».
Pois bem, alfacinha vem mesmo de alface (latim, lactuca saliva, do árabe al-khass) e o diminutivo é um sinal não apenas de afeto, mas também de uma certa depreciação… É que provavelmente foram os moçárabes dos arrabaldes, a quem os lisboetas chamavam saloios (da palavra çaloio, que era o tributo pago pelos padeiros mouros de Lisboa), que devolveram o cumprimento, comparando os lisboetas a grilos pelo gosto das alfaces que cultivavam, comiam e encomendavam aos almocreves que pagavam os seus tributos nas portas de Benfica para entrarem na cidade.
Correu a ideia de que no cerco de Lisboa de 1384 (de 4 meses e 27 dias) Lisboa se teria aguentado a comer alfaces. Não é verdade. O cerco foi levantado com o alarme de peste…
Em suma, «alfacinha» é um mimo dos moçárabes saloios, talvez cansados de exigências e sobrancerias…
Lisboetas, alfacinhas para sempre…
DIÁRIO DE AGOSTO
por Guilherme d’Oliveira Martins
1 de agosto de 2017