Reflexões

De 6 a 12 de Janeiro de 2003

“2003 começou. Um semanário falava este fim de semana de 30 razões para nos orgulharmos. Essa enumeração positiva …

"2003 começou. Um semanário falava este fim de semana
de 30 razões para nos orgulharmos. Essa enumeração
positiva contrasta com o pessimismo que alguns alimentaram e continuam
a alimentar sobre o nosso presente e sobre o nosso futuro. É verdade
que temos razões para olhar com esperança o futuro, do mesmo
modo que temos de exorcizar os demónios velhos que povoam o nosso
espírito colectivo. Eduardo Lourenço, nosso mestre, ensinou-nos
que Portugal é uma encruzilhada complicada de qualidades e defeitos.
Deixamo-nos embalar pelo optimismo e pelo pessimismo – mas não
parecemos dar-nos bem com o trabalho persistente e continuado. Calçámos
as pantufas da história? Limitamo-nos a fazer correr a manivela
da nossa vida, como lhe chamava Almada? Ontem era tudo mau, hoje pode
ser tudo bom – mas ninguém mudou, nem é possível
mudar tudo de um dia ao outro. "Felizes, o antigo mar da história
banha sem paixão o promontório sacro, donde outrora investimos
o desconhecido para hoje, ainda, por esse gesto, termos no silêncio
expectante de uma memória que nos julga na sua luz imperecível
um rosto e um nome que são os nossos por nós sermos deles.
Para que nova viagem para esse outro desconhecido que somos nós
mesmos e Portugal connosco?" – é ainda Eduardo que pergunta.

Edgar Morin questiona-se sobre os perigos
planetários. "Vamos para o abismo?" "A mundialização
do mercado económico, sem regulação externa nem
verdadeira autoregulação, criou novas ilhotas de riqueza
mas também zonas crescentes de pobreza; suscitou e suscitará
crises em cadeia e a sua expansão prossegue sob a ameaça
de um caos para o qual contribui poderosamente" (Le Monde, 1.1.2003).
Há semanas, a propósito da morte de Ivan Illich era este
o tema fundamental das nossas interrogações. Morin acredita
que pode haver energias que contrariem a barbárie e que tornem
o desespero e o medo em esperança. Há, no entanto, muitos
motivos para recusarmos qualquer indiferença ou a desatenção
relativamente a quem está ao nosso lado e que merece a nossa
ajuda e a nossa solidariedade.

Os dois temas juntam-se. Portugal e
a Europa estão numa encruzilhada que exige vontade, trabalho
e determinação, em nome da liberdade, da justiça
e do desenvolvimento solidário. A humanidade e o mundo precisam
de uma cultura de paz, baseada nos ideais da educação
e da cidadania – aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver
com os outros, aprender a ser."

Guilherme d`Oliveira
Martins
Presidente do Centro Nacional de Cultura

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