Reflexões

De 28 de Fevereiro a 6 de Março de 2005

A “Europa das Pátrias” cede lugar à “Europa dos cidadãos”. Por muito que haja resistências, a verdade é que, em vez de uma posição defensiva, torna-se indispensável tomar o conceito inclusivo de cidadania. A “Europa dos cidadãos” não pode fazer esquecer as diversas instituições, como factores de integração e de coesão.

REFLEXÃO DA SEMANA
De 28 de Fevereiro a 6 de Março de 2005


A “Europa das Pátrias” cede lugar à “Europa dos cidadãos”. Por muito que haja resistências, a verdade é que, em vez de uma posição defensiva, torna-se indispensável tomar o conceito inclusivo de cidadania. A “Europa dos cidadãos” não pode fazer esquecer as diversas instituições, como factores de integração e de coesão. Daí a necessidade de compreender que a “pátria” é um lugar de pertença, de memória e de identidade. A “identidade” deixa de ser perigosa quando se integra num contexto de diversas pertenças e serve para caracterizar o que somos e o que nos distingue dos outros. Por isso, a ideia de fronteira deixa de ser sinónimo de separação, para se tornar linha de diálogo, de troca e de preservação da memória. As diferenças e os conflitos são conaturais à humanidade, como o diálogo, a complementaridade e o intercâmbio. A ideia moderna de “nação” liga-se ao constitucionalismo liberal. A independência das nações resultou da autonomia dos cidadãos. Garrett ou Herculano falam de patriota ou de liberal como sinónimos. Eduardo Lourenço recorda, contudo, que “à medida que refaz o mapa político da Europa, Napoleão cria, sem o desejar, um nacionalismo de conteúdo estranho ou oposto ao que a Revolução quis exprimir”. As revoluções industriais conduziram à confusão entre independência e proteccionismo – e daí às tentações do “espaço vital” foi um passo. Houve quem resistisse. Mas o exacerbamento narcisista transformou-se em intolerância e totalitarismo. Afastámo-nos do velho conceito medieval de “nação” na Respublica Christiana. A soberania nacional não perdeu, porém, pertinência – deixou, sim, de ser horizonte exclusivo ou prevalecente. Quando terminou a segunda guerra, houve que limitar os efeitos perversos dos narcisismos nacionais. Hoje, depois do fim da guerra-fria, essa linha de acção entrou na ordem do dia. Os Estados representam a legitimidade do direito herdada do constitucionalismo. Os Povos representam o modo de representação e de legitimação aberta dos cidadãos, com as suas diferenças e peculiaridades. Daí a dupla legitimidade das democracias supranacionais – dos Estados e dos cidadãos. As fronteiras abriram-se e o velho conceito de “soberania” passou a ser limitado. As soberanias são, todas elas, partilhadas. A democracia moderna deixou de ser puramente nacional. É muito mais do que isso: é nacional, local e supranacional. Os conceitos de nação, de pátria, de povo e de Estado enriqueceram-se. Se nos lembrarmos da “geração de 70”, verificamos que, não se trata de uma crítica fatalista e sem perspectiva. Eduardo Lourenço fala de “novo patriotismo”, que é exigente e crítico, no sentido de mobilizar vontades criadoras e inconformistas – por contraponto a um “nacionalismo” que se identifica com o “ressentimento”. É o patriotismo crítico que deverá dar lugar à acção e basear-se no primado da lei e da justiça…       


 

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