Reflexões

De 25 a 31 de Outubro de 2004

“Terminou a quinta edição da Festa no Chiado. O público acorreu, houve entusiasmo e gosto pelo lugar de culto que é o Chiado. Valeu a pena. Vale sempre a pena regressar à aldeia de Fernando Pessoa. (…)”

REFLEXÃO DA SEMANA
De 25 a 31 de Outubro de 2004


“Terminou a quinta edição da Festa no Chiado. O público acorreu, houve entusiasmo e gosto pelo lugar de culto que é o Chiado. Valeu a pena. Vale sempre a pena regressar à aldeia de Fernando Pessoa. Em Maio voltaremos, nos 60 anos do Centro Nacional de Cultura, com um novo programa. Mas hoje, a propósito da 15ª Edição do Festival Internacional da BD da Amadora, falo-vos de histórias aos quadradinhos. E lembro Blake e Mortimer de E.P. Jacobs (1904-1987), cujas aventuras começaram a ser publicadas entre nós nas revistas de Adolfo Simões Müller (Cavaleiro Andante ou Foguetão). Philip Edgar Angus Mortimer, professor de física nuclear e Francis Percy Blake, capitão dos serviços secretos no MI-5 eram protagonistas do mistério apetecível, com uma visão cinematográfica do mundo e da vida. O “cronoscafo” permitia a condução através do tempo – desde os dinossauros até ao futuro, passando pelo tempo medieval e pelas jacqueries. O Clube do Centauro em Pall Mall tornou-se parte do nosso imaginário. Com Georges Remi (Hergé), Jacobs é uma das grandes referências da BD do século XX. Foi um apaixonado pela ópera, desde os idos de vinte, mas o desenho e o gosto da ficção científica é que o celebrizaram. Em 1939 cruza os destinos da Escola de Bruxelas e torna-se muito influente na nova arte, graças à intermediação do pintor Jacques van Melkebeke. A maturidade da “linha clara” foi atingida graças aos encontros de Hergé, primeiro com um jovem estudante chinês da Academia de Belas Artes de Bruxelas, Tchang Tchong-Jen, e depois com E.P. Jacobs. Do primeiro resultou a versão inicial do álbum “Lotus Azul” – primeira obra da maturidade de Hergé, na qual a influência oriental passou irreversivelmente a fazer parte da escola. E.P.Jacobs meteu ombros, a partir de 1944, à tarefa de reformular alguns álbuns de Hergé, e de preparar “O Tesouro de Rackam o Terrível”, “7 Bolas de Cristal” e “O Templo do Sol”, dando às aventuras de Tintim mais rigor, imaginação e versatilidade. N’“O Ceptro de Ottokar”, surgem na célebre prancha 59 auto-retratados Hergé e E. P. Jacobs, na cerimónia de cumprimentos na recepção triunfal ao rei Muskar XII, depois do “Anschluss” falhado da Sildávia, alegoria ao drama real europeu com a sombra negra de Musstler… O encontro com Hergé ocorreu após E.P. Jacobs ter-se dedicado a fazer uma versão das aventuras de “Flash Gordon”, de A. Raymond, em virtude de a censura alemã ter proibido a difusão das pranchas norte-americanas. Em 26 de Setembro de 1946, nasce em Bruxelas a revista “Tintin”, graças ao empenhamento de Raymond Leblanc, um resistente que apoiou decisivamente a reabilitação de Hergé. Aí vai surgir “O Segredo do Espadão”, aventura fundadora de uma nova era da banda desenhada. Seguir-se-ão as obras de maior fôlego como “A Marca Amarela” (1953) ou o “Enigma da Atlântida” (1955). Em qualquer delas encontra-se a narrativa em estado puro. É o puro prazer…”


Guilherme d’Oliveira Martins

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