Reflexões

De 21 a 27 de Junho de 2004

O Conselho Europeu de Bruxelas aprovou no dia 18 de Junho o Tratado Constitucional para a União Europeia. O acontecimento é suficientemente importante para obrigar a uma especial ponderação. A maior parte das vezes, os acontecimentos históricos mais significativos não são saudados com pompa e circunstância. A História faz-se de passos seguros e muitas vezes inesperados…

O Conselho Europeu de Bruxelas aprovou no dia 18 de Junho o Tratado Constitucional para a União Europeia. O acontecimento é suficientemente importante para obrigar a uma especial ponderação. A maior parte das vezes, os acontecimentos históricos mais significativos não são saudados com pompa e circunstância. A História faz-se de passos seguros e muitas vezes inesperados. Por isso, devemos estar de sobreaviso em relação a excessos de optimismo. Temos, pela primeira vez, uma Constituição Europeia formal. É um facto importante. No entanto, há muito que existe uma Constituição Europeia material, que define uma soberania livremente compartilhada e poderes próprios da União. Agora, teremos ainda uma Carta Europeia dos Direitos Fundamentais, com força obrigatória e uma União com personalidade jurídica de Direito Internacional, que poderá ser parte na Convenção Europeia dos Direitos Humanos, e teremos um Tratado legível para o comum dos cidadãos, com disposições e procedimentos mais simples e acessíveis. E a verdade é que, digo-o com legítimo orgulho por ter participado nesse processo, o que acaba de ser conseguido deve-se ao trabalho da Convenção para o Futuro da Europa, que rompeu com o método do secretismo na preparação das Conferências Intergovernamentais. Muito foi dito sobre a Convenção, mas a verdade é que foi o trabalho aí realizado (até mais do que o texto do projecto de Constituição) que possibilitou e possibilitará avançar para além da timidez e dos egoísmos. Quase sessenta anos depois do fim da Guerra, não podemos esquecer que a Europa precisa de ser um lugar e um factor de Paz. Como? Através de uma União de Estados e Povos livres e soberanos. E essa União precisa de uma Magna Carta – que clarifique as fronteiras dos poderes soberanos (europeu e nacionais), que consagre a cidadania europeia, que articule eficácia orgânica e democracia, que salvaguarde o respeito pelos princípios da proximidade e da proporcionalidade, que dê aos cidadãos e aos parlamentos nacionais uma voz activa, que permita a adopção de políticas visando a coesão económica, social e territorial, bem como o pleno emprego, a competitividade, a equidade e a justiça. Mais importantes do que a arquitectura constitucional são as políticas europeias que pudermos concretizar no novo quadro. E o certo é que o novo Tratado Constitucional, que salvaguarda as soberanias nacionais e que clarifica a soberania europeia, poderá abrir caminho (ainda que tímido) à criação de uma vontade comum europeia, assente em duas legitimidades, a dos Povos (ou dos cidadãos) e a dos Estados. Em lugar do fatalismo da lei da força de uma política intergovernamental ditada por um directório de grandes (que existirá tanto mais quanto menos Europa política houver), é preciso criar instrumentos que os cidadãos compreendam e que estejam ao seu alcance. Só assim se promoverá uma cidadania europeia efectiva.

Guilherme d`Oliveira Martins

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