Reflexões

De 2 a 8 de Fevereiro de 2004

O ciclo das bibliotecas prossegue no programa de passeios do Centro. Foi agora a vez, no sábado passado, de visitarmos a Biblioteca Municipal de Orlando Ribeiro, na parte antiga de Telheiras, instalada no Solar da Nora. E pudemos encontrar um lugar cheio de vida, com muitos leitores, de todas as idades, a começar na gente de palmo e meio…

O ciclo das bibliotecas prossegue no programa de passeios do Centro. Foi agora a vez, no sábado passado, de visitarmos a Biblioteca Municipal de Orlando Ribeiro, na parte antiga de Telheiras, instalada no Solar da Nora. E pudemos encontrar um lugar cheio de vida, com muitos leitores, de todas as idades, a começar na gente de palmo e meio. Um autêntico deleite, para quem acredita que a cultura e a educação exigem um forte investimento da comunidade e das famílias. E ali vimos pais e filhos, estudantes, pessoas de todas as idades lendo, convivendo, num ambiente acolhedor e agradável. Os livros, a música, as novas tecnologias, o espaço das brincadeiras para as crianças – tudo ali está, numa imersão total num espaço de cultura viva. O arquitecto Duarte Nuno Simões, autor do projecto, à frente de uma equipa entusiasta, que o acompanhou nesta visita, foi o cicerone ideal. “A Biblioteca – recorda-nos – é dedicada às viagens e integra dois edifícios: um pré-existente, o Solar da Nora do fim do século XVIII, a nascente, e um outro, de raiz, a poente, unidos entre si pelo pátio original e por uma ligação em parte coberta, à qual se acede quer pelo interior do solar quer pela escada exterior do mesmo”. E que melhor homenagem poderia ser feita a Orlando Ribeiro (1911-1997)? A quem, sendo o primeiro dos nossos geógrafos, sempre ensinou que para compreender a geografia seria necessário cultivar outros saberes, como ele próprio fez. A história, a sociologia, a antropologia, a linguística, a geologia – tudo isso tem de completar o estudo da geografia como Orlando Ribeiro fez. “O gosto da geografia devo-o, dizia, ao amor da natureza e da vida do campo desenvolvido em longos passeios a pé, que dava nos arredores de Viseu”… E não nos esqueçamos que o mestre ensinava aos seus alunos serem fundamentais os trabalhos de campo. “A Geografia faz-se, antes de mais nada, com os olhos e com os pés” – costumava repetir com sentido de humor. Com a sua máquina fotográfica, um sucinto farnel e um bloco de notas, o professor fazia cinco ou seis léguas diárias nos dias de peregrinação – e assim descobriu como poucos que o território faz a cultura e que a nossa identidade resulta do cruzamento das influências do Atlântico e do Mediterrâneo. “Sob a severa disciplina da ciência, a amorosa compreensão da terra e da gente, essência da Geografia”. Como entender o país? Como descobrir a fronteira e o seu significado e a importância da cordilheira central? Como perceber a Arrábida, santuário mediterrânico à beira Atlântico? Ou como interpretar a transição e a passagem na Beira Interior? Leia-se como imprescindível obra de referência “Portugal, o Atlântico e o Mediterrâneo”, dedicado aos camponeses, pastores, moleiros, almocreves, pescadores e gentes de outros ofícios, obra-prima da nossa literatura, exemplo de encontro entre a cultura e ciência. Verificámos, no sábado, que o espírito de Orlando Ribeiro está vivo!

Guilherme d`Oliveira Martins

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