Trinta anos passaram sobre o dia 25 de Abril de 1974. O que significa a data? É mais do que uma mera invocação histórica, como o 5 de Outubro ou o Primeiro de Dezembro? Para os jovens que nasceram depois de 1974 é uma invocação, mais ou menos conhecida, mas a reconquista da liberdade é quase um dado do passado. Para muitos é a madrugada libertadora, que Sophia cantou e por que tantos esperaram durante várias décadas. Para outros é um momento difuso sobre o qual há discursos contraditórios – ora positivos, ora negativos. Uma revolução tem sempre interpretações diferentes. Lembremo-nos das grandes revoluções liberais e democráticas dos três últimos séculos. Não há dúvidas de que muito lhes devemos, mas todas estão cheias de luzes e sombras – porque a história dos homens é poliédrica, complexa e contraditória. Sabemos que o parlamentarismo moderno nasceu com a Gloriosa Revolução inglesa de 1688-89. Montesquieu tornou-a um bom mito da nossa civilização. Edmond Burke elogiou-a, por contraponto à revolução francesa. No entanto, se formos a Belfast, a memória dessa revolução é ainda hoje violenta e envolta em tragédia e sangue. A revolução americana foi fundamental para a consolidação da democracia ocidental, mas o “tea party” foi tudo menos uma amena partida de bridge, cheia de “fair play” e de civilidade. A revolução francesa de 1789 começou com Luís XVI satisfeito com o curso dos acontecimentos, no sentido da tolerância e da liberdade, e terminou com o “terror”, mas continuou com Napoleão Bonaparte a levar ambiguamente os ideais da liberdade pela Europa, como bem se nota nessa obra-prima do romance europeu que é “Guerra e Paz” de Leão Tolstoi. Hoje sabemos que as três revoluções estão intimamente ligadas entre si. Todas se completaram. E quando alguns consideraram que a revolução russa de 1917 era a superação dos três grandes movimentos liberais, a História desmentiu-os. Afinal, a liberdade, a igualdade e a fraternidade continuavam actuais, Montesquieu, Rousseau, Kant, Tocqueville, Jefferson continuam a dizer que a liberdade humana precisa de mais do que de “electricidade e sovietes”, ao contrário do que pretendeu o Sr. Ulianov. Quer isto dizer que nada se passou desde 1789 sob a lua? Muito pelo contrário. A sociedade industrial construiu o Estado Providência, depois do relatório Beveridge de 1942, concretizou a Economia Social de Mercado nos “trinta gloriosos anos” (1945-1975) e hoje procura realizar a sociedade do conhecimento através de uma globalização regulada, com dimensão social. Samuel Huntington considerou a revolução portuguesa como a primeira de uma nova fase. O 25 de Abril de 1974 é, assim, mais do que uma data histórica. É um desafio que continua a ter de se completar – com um compromisso europeu e universal e com um contrato social que possa ligar paz, desenvolvimento sustentável, coesão e diversidade cultural.
Guilherme d´Oliveira Martins