Já compreenderam por certo que este Folhetim, que está a dar as últimas, como uma coleção de fantasmas, que conto reunir em breve para tentar compreender qual o mistério que esta amálgama encerra. E não seria possível fazer essa reunião final em que vou tentar descobrir o enigma que liga estas personagens nascidas no papel. E, por isso, pedi ajuda ao meu amigo Jaime Ramos, que é especialista no assunto, e tem já uma série de ideias que me mostrou e poderão ser úteis. Decidi, porém, deixar em paz um outro amigo, António Sousa Homem, que continua na pacatez de Moledo do Minho, a lembrar “O Crepúsculo em Moledo e outras elegias”… Jaime Ramos foi inspetor responsável pela secção de homicídios na Judiciária do Porto. Solitário, pessimista e algo conservador, não se escandaliza com nada. Tudo o que é humano é compreensível e digno de atenção. Tem uma namorada no Porto, que vive no mesmo prédio, dois andares acima do seu, sem casa comum. Gosta de ler, fumar charutos comprados em Espanha, não perde a boa comida e não tem dúvidas de que o Porto é uma Nação. Quando lemos “Morte no Estádio”, “Duas Águas do Mar” ou “Um Céu Demasiado Azul” percebemos que a «marca melancólica, ou nostálgica, é também uma forma de conhecimento ou de apreensão da realidade. E confessa Francisco José Viegas, o criador: «um dia, o José Saramago, que tinha acabado de ler “Morte no Estádio”, disse-me uma coisa desse género: eu li o livro, mas aquilo não é bem policial. Estávamos na Ericeira, numa casa em cima do mar, e eu disse-lhe, “olhando à volta, que linguagem usaria para falar desta beleza toda, ou de uma personagem que fica tocada por ela?”. Não era com certeza uma coisa seca, direta e pouco dada a estados de alma. Em suma, Jaime Ramos é «um burguês do Porto. Um burguês mais ou menos conservador de uma cidade burguesa e conservadora. Um velho teimoso. Não fui eu que o fiz assim, diz Francisco José, foi ele que nasceu desta forma, como um pessimista, um cínico, um homem que procura alguma espécie de sensatez e de conforto. Ele foi militante comunista no passado, um homem que aprendeu a natureza da desilusão, da derrota e da perda. E não gosta de coisas novas, de comida nova, nem de novos jogadores do FC Porto. Por ele, ainda jogariam o Jardel, o Rodolfo, o Rolando e o Cubillas. E o Gomes».
Porque fui chamar Jaime Ramos? Para não esquecer Mário Zambujal e a Quadrilha do Renato, do golpe falhado no Museu Gulbenkian, cada um dos elementos da quadrilha e como se conheceram. Entre o dramático e o ridículo, é uma ilusão, com boas intenções, para deixar a vida do crime medíocre, porque ninguém rouba ou mata por gosto, mas por não terem outra escolha. Renato, Marlene, Flávio, Arnaldo, Pedro, Adelaide e Silvino, todos rejeitados pela sociedade por falta de oportunidade, deram por si mesmos a viver do outro lado das leis. Mas não esqueço ainda o “Repórter X” de Reinaldo Ferreira, nem “O que Diz Molero”, de Dinis Machado (o celebrado Dennis McShade de outros policiais), que conta a história de um rapaz de uma comunidade difícil, que mergulha no mundo em busca de uma grande aventura. Molero é o detetive incumbido pelos seus superiores, Austin e Mister Deluxe, de seguir o itinerário – mental, emocional e geográfico – do rapaz e fazer os respetivos relatórios. Estes vão sendo comentados e discutidos, e o leitor conhece a história do rapaz: as viagens, as mulheres, os livros. O romance revolucionou a linguagem, a literatura, e a maneira de ver a narrativa, com vinte edições desde a sua primeira publicação, em 1977. E houve Dick Haskings, António Andrade Albuquerque (1929-2018), autor de “O Isqueiro de Oiro” e Ross Pynn, Rossado Pinto (1926-1984). E vem à baila a coleção Vampiro, dos Livros do Brasil, de António Augusto de Souza-Pinto (1944), com 680 volumes publicados da melhor literatura policial. Quantos de nós não lemos Agatha Christie nos livros Vampiro, como Conan Doyle, Ellery Queen, Raymond Chandler, Dashiell Hammett?… Por isso, fico grato ao Jaime Ramos por me ajudar…
Agostinho de Morais