Reflexões

De 8 a 14 de Dezembro de 2003

Acaba de sair nas bancas a Fotobiografia de Helena Vaz da Silva, da autoria de Alberto Vaz da Silva e de Fernando Dacosta (Editorial Notícias). Dentro de uma semana a obra será lançada da Fundação Calouste Gulbenkian, no dia em que assinalaremos também os quarenta anos da revista “O Tempo e o Modo”. Não se trata de uma invocação do passado, mas de uma reflexão sobre o futuro. A alegria de Helena, estampada na capa do novo livro é sinal de esperança e de vida nova…

Acaba de sair nas bancas a Fotobiografia de Helena Vaz da Silva, da autoria de Alberto Vaz da Silva e de Fernando Dacosta (Editorial Notícias). Dentro de uma semana a obra será lançada da Fundação Calouste Gulbenkian, no dia em que assinalaremos também os quarenta anos da revista “O Tempo e o Modo”. Não se trata de uma invocação do passado, mas de uma reflexão sobre o futuro. A alegria de Helena, estampada na capa do novo livro é sinal de esperança e de vida nova. É a liberdade de espírito que se invoca. É a cultura como criação e como comunidade que se enaltece. “Nada do que é vivo é uma coisa só” – dizia Helena. “Há uma escala entre os dois extremos na qual tudo se joga. Importa que cada um tanja a sua nota, aquela que é só sua, e se ponha à escuta da dos outros. Tocata e fuga da vida”. A história não evolui linearmente, mas em espiral ascendente… A vida faz-se enfrentando a incerteza e a complexidade, como nos ensina Edgar Morin. António Alçada Baptista e João Bénard da Costa, à frente da extraordinária equipa da revista de pensamento e acção, que lançou uma lufada de ar fresco e de inconformismo na sociedade portuguesa, mantêm actual a sua mensagem contra as diversas formas de “desordem estabelecida”. Helena e Alberto fizeram parte dessa equipa. A revista nasceu de um “pacto”, que não chegou a concretizar-se, e projectou-se na sociedade portuguesa com muito mais força do que alguma vez os seus fundadores puderam supor. Havia consciência do momento político, mas talvez não houvesse uma compreensão exacta do sentido profético do projecto. Foi uma aventura de liberdade, fundamentalmente. Tratou-se de abrir horizontes e de abandonar fórmulas gastas. Houve muitos caminhos, muitas incertezas, muitas ilusões. No essencial, ficou o “compromisso” e o “afrontamento”. Compromisso com a modernidade e com o futuro, sem esquecer as raízes. Afrontamento em relação à indiferença, à injustiça e à mentira. Há quarenta anos, João XXIII escreveu “Pacem in Terris” e esse texto mantém-se tão actual como no dia em que foi feito, o Concílio Vaticano II abriu as portas e as janelas da Igreja à modernidade, John F. Kennedy foi assassinado, mas deixou a “Nova Fronteira”, uma sementeira de igualdade e de direitos humanos, Sophia dissera “Ó vendilhões do templo/ Ó construtores/ Das grandes estátuas balofas e pesadas/ Ó cheios de devoção e de proveito” e Jorge de Sena: “nada resta senão este ar maligno,/ esta vileza insana, este morder/ raivoso e traste, esta indiferença/ que nega mais a vida que a maldade”. Havia quem julgasse ouvir, mas não ouvia; e havia quem ouvisse, mas não entendesse… “Como poderemos ser europeus de corpo inteiro sem que tenhamos tomado consciência de nós?” O espírito de Helena continua vivo! “Se amanhã fosse o fim do mundo, iria mesmo assim hoje plantar uma macieira”…

Guilherme d`Oliveira Martins

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